A Cultura do Gaman no Japão


A arte do Gaman no Japão

Gaman (我慢) é um termo japonês, que tem origem no zen-budismo e significa algo como “suportar o que aparenta ser insuportável com paciência e dignidade”.

O termo é geralmente traduzido como “perseverança”, “paciência” ou “tolerância”. Um termo relacionado, gamanzuyoi (我慢強い, gaman-tsuyoi), um composto com tsuyoi (forte), significa “sofrer o insuportável” ou ter uma alta capacidade de resiliência diante das situações.

É fazer o melhor em tempos difíceis e manter o autocontrole e a disciplina. Um exemplo claro foi após o terremoto e tsunami de 2011. A resiliência, civilidade, falta de saques e capacidade dos japoneses de ajudar uns aos outros foi amplamente atribuída ao “espírito gaman”.

Embora possa se referir à resiliência diante de crises de grandes magnitudes, também pode se referir às atitudes dos japoneses sobre preocupações menores e cotidianas. Muitas vezes o “gaman” é ensinado aos jovens e amplamente usado pelas gerações japonesas mais velhas.

Apesar de gaman ser visto como um sinal de maturidade, polidez e força e ter ajudado na criação de uma sociedade ordenada, ele também tem seu lado obscuro na sociedade, onde é imposto uma pressão sobre o indivíduo causando um grande impacto em sua saúde mental.

Gaman: Uma virtude ou um infortúnio?

A arte do Gaman no JapãoImagem: photo-ac.com

Os visitantes do exterior costumam se surpreender com o comportamento calmo e ordenado visto até mesmo em meio às multidões nas metrópoles japonesas e a disposição das pessoas em esperar pacientemente pelo transporte, lançamentos de marcas, entre outras coisas.

Mas o fato é que os japoneses valorizam não falar muito e suprimir sentimentos negativos em relação aos outros. O autocontrole faz os indivíduos frearem seus sentimentos para evitar confrontos e, desta maneira, manter laços sociais harmoniosos com todos ao seu redor.

Os indivíduos devem mostrar paciência e perseverança diante de situações inesperadas ou difíceis e o treinamento começa desde cedo; as crianças aprendem pelo exemplo dos pais. Paciência e perseverança também fazem parte da educação, começando na escola primária.

As mulheres também são educadas para fazer “gaman” o máximo possível, diz Noriko Odagiri, professora de psicologia clínica da Universidade Internacional de Tóquio. Muitas mulheres se sentem presas em casamentos infelizes e procuram não expressar sentimentos negativos.

O divórcio se torna complicado pois muitas deixaram de lado suas carreiras por causa da família e não são mais financeiramente independentes. E aquelas que trabalham fora muitas vezes são acometidas por situações de assédio moral e sexual por parte de seus chefes.

O gaman é na verdade uma forma de “sofrer em silêncio” para não incomodar os outros. Ele pode se manifestar a longo prazo, como ficar em um trabalho desagradável ou tolerar um colega irritante, ou a curto prazo, como ignorar um passageiro barulhento em um transporte público.

Esse esforço das pessoas resolverem seus problemas por si mesmas também é uma maneira de não se sentirem diferentes ou excluídas dentro de seu grupo social. Mas todo esse esforço em manter a ordem externa pode levar alguns indivíduos a explosões de raiva, que podem resultar em um alto grau de estresse no trabalho ou até mesmo em violência doméstica no âmbito familiar.

O que Gaman representa nos dias de hoje?

Carpas e flor de lótus DepositphotosImagem: Depositphotos

Gaman se originou nos ensinamentos budistas como uma maneira de melhorar a imagem de si mesmo e também perante aos outros. Foi aperfeiçoado durante o boom econômico do Japão no pós-guerra, quando o trabalho assumiu o status de construção da nação – o que significa sacrificar o tempo com a família por longas horas de trabalho nas fábricas ou escritórios.

Desde então, a paciência e perseverança tornou-se uma característica marcante do Japão. Alguns dos elementos japoneses que simbolizam o gaman estão as carpas, com sua tenacidade em subir rios contra a forte correnteza e as flores de lótus, cujas pétalas se fecham e mergulham em águas lamacentas a noite e ressurgem à superfície, limpas e majestosas ao amanhecer o dia.

Apesar do seu belo conceito, vimos que “gaman” tem pontos positivos e negativos. E muitos jovens atualmente não se preocupam tanto em fazer “gaman” como seus antepassados. A realidade vivida por eles hoje é muito diferente dos que viveram sua juventude há 30 anos.

Mas existe várias razões para esse comportamento. O sistema de emprego vitalício atualmente está em colapso, as pessoas estão se casando mais tarde, mais mulheres estão trabalhando e a taxa de natalidade está no nível mais baixo da história. Muitos jovens trabalham em contratos temporários ou em empregos de meio período onde o gaman não tem um papel tão relevante.

A sociedade japonesa está realmente mudando. Antigamente, os homens faziam carreiras em empresas onde trabalhavam longas jornadas, enquanto as mulheres eram normalmente colocadas em empregos não promovidos para que pudessem deixar a empresa para criar os filhos.

Hoje a maioria é contratado e demitido e são pagos por horas trabalhadas. Muitos deixam o emprego e partem em busca de outro quando não se adaptam ou algo não sai da forma que gostariam, diferente de antigamente onde havia de fato um sentimento esforço de adaptação.

Apesar de gaman ser um fator que contribui para a baixa taxa de criminalidade do Japão e haver uma expectativa onde as pessoas cuidam umas das outras e evitar conflitos, por outro lado, pressiona todos a fazerem a mesma coisa e deixa pouco espaço para diferenças.

Talvez, o mundo ideal seja o meio termo de tudo isso, onde as pessoas possam viver em harmonia em sociedade sem deixar de lado suas necessidades pessoais e convicções em busca de uma melhor qualidade de vida e saúde mental em dia. Mas, e aí? Qual sua opinião sobre o assunto? 🙂 Deixe seu comentário abaixo a respeito do artigo e sobre a bela filosofia do “gaman”.

Fonte: BBC.com

3 Comentários

  1. Hideo Matsuoka

    Creio que a unanimidade de pensamento, maneira de trabalhar, convívio social, não é considerado uma boa sociedade

  2. Melissa Cezar Milanesi

    Eu penso que um meio termo seria o ideal

  3. Pingback: Dia Nacional da Imigração Japonesa | Curiosidades do Japão

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