A Sombra do Bambu


A SOMBRA DO BAMBU

Até onde o amor pode nos levar? Conheça a história que nasceu da insistência e da devoção na Floresta de Arashiyama

Por Mara Vanessa Torres & Rafaela Torres

No Dia Sagrado em que o sol, a lua e as nuvens tecidas por aranhas se encontram, Izumi aparecia no mundo dos seres humanos. Filha de um respeitado aristocrata, Izumi foi transformada em um frondoso bambu ao pular da Ponte Togetsukyo.

Dizem que a Lua, ao atravessar a ponte em uma noite sem nuvens, encheu o coração de pesar ao testemunhar o desespero de Izumi e pediu clemência por sua alma.

Dessa forma, a mulher foi transformada em um bambu da Floresta de Arashiyama. Apenas no Dia do Encontro Sagrado, Izumi tinha autorização para fazer uma visita ao seu antigo lar.

Usando um quimono lindamente tecido e bordado com delicadeza, a bela mulher deixava os cabelos soltos ao vento e deslizava pelos arredores de Arashiyama.

A SOMBRA DO BAMBU

Em uma das ocasiões do Dia Sagrado, no tempo em que o pensamento do homem ainda estava voltado para as estrelas, Izumi deixou a aparência de bambu e iniciou a sua caminhada.

Nas imediações, o boticário Himura voltava do templo, onde havia agradecido pela recuperação de sua mãe. A boa senhora recebera dos deuses alguns anos a mais para continuar sentindo o sopro da vida.

Quando Himura viu Izumi, o seu coração imóvel por tantos anos incendiou. Imediatamente, o boticário se apaixonou pela mulher que circulava pela floresta de bambu como se fosse um fantasma.

Em um piscar de olhos, perdeu-a de vista. No outro dia, antes do amanhecer, Himura retornou à Floresta de Arashiyama, mas nada encontrou. O vento soprava lentamente, provocando as folhagens em ruídos de paz e sossego. Dentre todos os bambus, um deles era grande e vistoso, criando uma sombra delicada sobre a cabeça angustiada do boticário.

Himura voltou todos os dias ao mesmo local, mas não encontrou a mulher. Ela sumiu sem deixar rastros. Desesperado, o boticário foi ao templo e, ajoelhando-se com extrema humildade, pediu que lhe trouxessem a visão da amada uma vez mais.

O pedido foi repetido dia após dia durante quinze anos, quando o Momento Sagrado chegou. No instante em que o sol, a lua e as nuvens tecidas por aranhas se encontraram novamente, Izumi libertou-se de sua forma de bambu e saiu a perambular pela Floresta de Arashiyama. Ela havia testemunhado a devoção de Himura, e o amor do boticário tocou o seu coração.

Quando Izumi o avistou, apareceu radiante em sua frente. Atordoado e feliz de paixão, Himura ajoelhou-se e beijou aqueles pés delicados, agradecendo aos deuses pela graça concedida.

Tocada pelo amor verdadeiro, a Lua intercedeu novamente por Izumi e também por Himura, pedindo que os dois se tornassem um só. Quando o último segundo do Dia Sagrado se dissipou, dois bambus enormes, fortalecidos e bonitos, foram vistos juntos um do outro, sacudindo as folhas no bosque de bambus.

Enquanto todos os outros cresciam com certa distância, os dois bambus entrelaçados formavam uma sombra espetacular, que sussurrava palavras de amor ao roçar do vento.


Mara Vanessa Torres é escritora, jornalista, revisora e crítica cultural. Tem profunda admiração e crescente interesse pelo universo artístico e cultural nipônico. @abyssal_waters

Rafaela Torres é escritora, psicóloga, ilustradora e gamer. Apaixonada pela cultura asiática. @rosenightshade

Imagem do topo: ‘Ancient Shrine’ de Lorenz Hideyoshi Ruwwe

1 Comentário

  1. Maria

    É uma história muito comovente. Fui às lágrimas!

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